Trouxe pela mão o sonho do mais pequeno já lá vão 17 anos. O Bruno deixou o futebol. O Zé, o pai, nunca mais saiu de campo. Foi motorista da carrinha dos infantis onde jogava o filho e passou a delegado das equipas dos filhos dos outros. O Bruno foi dispensado. O pai ficou por cá, no banco de suplentes, no campo a encher sacos de areia para prender as balizas, ou a remendar o que há para remendar. Tudo por paixão ao clube onde o filho nunca foi mais um.
No último treino antes do primeiro jogo a sério lá está o delegado Zé Miguel. “Este veio do Oeiras. É bom o miúdo. E este é central, veio do Loures”, explica junto à linha lateral enquanto cumprimenta o grupo, um a um. Na memória, aquele dia em que trouxe o filho Bruno pela mão para começar nas “escolinhas” do Estoril Praia. “Foi no ano 2000, ele tinha 10 anos. Ficou cá até aos Juniores, depois saiu para o Fontainhas e eu fiquei”, conta a sorrir.
Aos 60 anos, o delegado mais antigo do clube diz que foi “o bichinho” que lhe mordeu. Vamos chamar-lhe paixão. A verdade é que ao contrário do que acontece com muitos pais no mundo do futebol, a história do Zé Miguel não se confunde com o percurso do filho. “Cada um seguiu o seu caminho, com autonomia”, resume. No início, o pai até foi o motorista dito oficial da carrinha dos infantis onde o Bruno jogava, mas rapidamente as estradas se separaram. "Houve épocas em que praticamente não o via jogar. Ele jogava à mesma hora em que eu tinha de estar no banco como delegado de outro escalão do clube", explica o pai.
Foi assim até ao dia em que o filho foi dispensado e seguiu para o Fontainhas. "Ele foi e eu fiquei", resume sem fatalismos. Os dois aprenderam desde cedo que o futebol tem de ser o mundo das pessoas felizes. E para eles foi, sem cobranças, como se a distância fosse apenas o espaço necessário para cada um fazer o que mais gostava. O Bruno continuou a jogar longe do olhar do pai e o Zé ficou com os olhos postos nos filhos dos outros. "Um dia cheguei ao bar estava um miúdo cheio de dores de cabeça. Perguntei-lhe se tinha fome. Disse-me que sim. Tinha passado o dia sem comer. Claro está que tratei rapidamente do lanche do rapaz". Felizmente há poucos episódios como este no livro de memórias do coordenador dos delegados. "A minha preocupação tem sido sobretudo com os conselhos sobre os estudos, porque para esta coisa do futebol é preciso ter sorte", lembra.
Quem conhece o delegado, destaca o homem. É o caso de Victor Neves, vice-presidente do clube para o Futebol de Formação. "O Zé Miguel tem o contacto de todos os jogadores, sabe de cor os números das camisolas e só não faz pelo clube aquilo que não pode. O Estoril Praia é feito de gente assim. O clube deve-lhe muito", palavras de quem também vai para o banco sempre que pode.
O treino acabou. Zé Miguel vai estar mais uma época ao lado do treinador Diogo Vilhena no banco dos juniores. O filho deixou a bola. O pai não vê a hora dela recomeçar a rolar.
Texto: Filipe Mendonça
Categoria: Futebol de Formação , Futebol Formação , Notícias , Viver estoril
Francisco Braga - 17 Agosto, 2017 a 9:41
Grande texto. Emocionante. Obrigado Zé Miguel, isto é o Nosso Estoril Praia!
Teresa Dionísio - 17 Agosto, 2017 a 11:53
Palavras para quê? Escreveram tudo a respeito do Zé é uma família espetacular que me viu crescer e tenho a maior ademiracao e carinho
João Simões (sócio nº 150) - 17 Agosto, 2017 a 13:59
Nós somos assim… Gostamos disto porque gostamos, e pronto… Quem é contagiado pela ‘febre amarela’ nunca mais se cura… Ainda bem… Obrigado Zé Miguel por tudo quanto tens feito pelo nosso Estoril-Praia!!! Um abraço!!!
Tiago Vitorino - 17 Agosto, 2017 a 20:33
Ola,conheço bem o Ze Miguel.Excelente pessoa,bom amigo.Grande homem.Do melhor que apanhei na bola.E já agora gostava de perguntar algo…Para quando uma referencia aos Juniores de 2005/2006 Que fizeram história pelo clube ao disputarem o título nacional a 4 com Sporting ,Porto e Boavista!?Um feito inédito e épico no GDEP.Nunca tiveram a devida homenagem.
Jose Aragso - 17 Agosto, 2017 a 21:01
Ze Miguel, grande profissional e grande amigo, para além de ser uma das pessoas que mais sabe de futebol e dos miúdos que têm sonhos!
Rui Rosenstock - 18 Agosto, 2017 a 2:31
Este Filipe Mendonca e’ um senhor, usa as palavras na forma escrita de forma informal e verdadeira, consegui sentir a humildade e a verdade, esta nossa familia nao existe podem ate’ haver parecidas mas o ESTORIL e’ unico. um bem haja aos q fizeram aos q fazem e aos q faram pelo nosso querido ESTORIL-PRAIA.